Contra a história oficial: narrativas do ativismo nas ruas
Consumidos pelo fogo
Praça Syntagma, centro de Atenas. Lugar onde estão localizados o Túmulo do Soldado Desconhecido e o Parlamento Helênico. Uma praça com grande fluxo diário de turistas e usuários do metrô, mas que também serve como ponto de referência para as principais manifestações populares ocorridas na Grécia. Na tarde de 5 de abril de 2012, milhares de pessoas se reuniram ao redor de uma árvore em frente ao parlamento e ali deixaram mensagens escritas à mão, velas e flores. Um dos papéis presos à árvore trazia uma citação de Ésquilo, dramaturgo da Grécia Antiga: “Nós não enterramos os nossos mortos. Nós os colocamos na linha da frente.” Os manifestantes estavam prestando uma homenagem ao farmacêutico aposentado Dimitris Christoulas, de 77 anos, que nesse mesmo dia pela manhã havia suicidado-se discretamente com um tiro na cabeça debaixo daquela árvore, em um horário de pleno movimento na praça. O bilhete deixado pelo aposentado no local dizia o seguinte:
O governo de Tsolakoglou acabou com a minha possibilidade de poder sobreviver com uma pensão digna, que paguei sozinho durante 35 anos sem nenhuma ajuda do Estado. E, sendo que a minha idade avançada não me permite reagir de forma dinâmica (embora se um colega grego pegasse uma Kalashnikov, eu estaria bem atrás dele), não vejo outra solução senão pôr um fim à minha vida de forma digna, para que eu não me veja obrigado a revirar o lixo para assegurar o meu sustento. Eu acredito que os jovens sem futuro um dia irão pegar em armas e pendurar os traidores deste país na praça Syntagma, assim como os italianos fizeram com Mussolini em 1945.[1]
A homenagem a Christoulas foi uma ação coordenada através de convocatórias nas redes sociais usando o slogan “Isto não é um suicídio. Isto é um crime.” Pela noite, os manifestantes tentaram se aproximar do parlamento, mas foram duramente reprimidos pela polícia. Christoulas é mais um cidadão grego que, desesperadamente, decidiu pôr fim a sua vida em resposta à violenta crise que atualmente assombra a Europa. Para muitos, uma possível vitória da esquerda radical representada pelo partido Syriza nas recentes eleições, defensor da nacionalização dos bancos e do cancelamento de parte da dívida, seria um acontecimento-chave para mudar o destino da Grécia na Zona Euro. Mas, o novo governo administrado pelo partido de centro-direita Nova Democracia ainda enfrenta o mesmo quadro econômico de anos, caracterizado pelo alto índice de desemprego entre os jovens, precarização das jornadas de trabalho, aumento dos impostos, reduções e cortes nas aposentadorias e salários, suspensão de serviços públicos básicos de saúde e educação, privatizações e falências.
Os planos de resgate financeiro pela Troika, formada por equipes da União Europeia, Banco Central Europeu e Fundo Monetário Internacional, têm se mostrado desastrosos. Contra as reformas neoliberais e as medidas de austeridade da Troika, manifestantes passam os dias lutando nas ruas de Atenas, ocupando ou realizando assembleias nas praças.[2] Todos esses manifestantes gregos estão sofrendo com os efeitos dessa crise e de suas dívidas. Todos esses manifestantes gregos são Dimitris Christoulas. As imagens de incêndios consumindo carros e edifícios, e de uma multidão protestando e sendo atacada pela polícia, circulam quase que diariamente na mídia. É preciso encontrar uma outra interpretação para essas “imagens do fogo”. É preciso refletir sobre o que está por trás das implicações políticas dessas imagens (HOLMES, 2006).
A cena final do documentário December Seeds (Δεκεμβριανοι Σποροι / Sementes de Dezembro, 2009)[3], realizado por Panagiotis Karagiorga mas que atribui a sua autoria ao cineasta francês Chris Marker, realiza uma operação política imaginativa ao mesclar imagens do confronto entre os ativistas gregos e a polícia com fogos de artifício e as comemorações populares na Praça Syntagma durante o réveillon de 2009. Os fogos trazem uma pergunta final: “Não é aqui onde começa o filme, Liberdade? / Sim, Alex”. “Alex” é Alexandros Grigoropoulos, estudante grego de 15 anos que foi morto a tiros por um policial em 6 de dezembro de 2008. Alex é o espectro político que vagueia por Atenas durante todo o filme. Sua morte levou a Grécia a um levante popular de trabalhadores e jovens desempregados motivados por causas diversas, desde a repressão do governo aos anarquistas à situação de um grave desmantelamento do Estado social. Os fogos da entrada de 2009 anunciam em December Seeds um novo documentário, As Sementes (Les Germes), um filme ainda não realizado por Marker. Explosões nos ares conflagram o início de uma obra ainda inexistente, mas que convida o espectador em sua ficção imaginar os capítulos que continuariam a ser duramente revelados nas ruas da Grécia, como o texto pronunciado pelo fantasma de Alex em uma das passagens do filme: “Olhei pela janela e vi a rua vazia. Um garoto com um skate saía da fumaça que deslizava entre as pedras. Então me lembrei, pronunciei o primeiro verso: ‘estamos aqui novamente na espiral da história.’”
Afluências possíveis
Qualquer pessoa que participa de um protesto ou olha para as imagens de uma manifestação, das ocupações dos espaços públicos, das máscaras de gás, das bandeiras, faixas e camisetas com frases e símbolos e do confronto violento com a polícia deve se perguntar como os registros visuais desses eventos circulam. A realização de documentários políticos impulsionados nas últimas duas décadas por artistas e ativistas, o uso de computadores pessoais, câmeras de vídeo, ferramentas de edição mais acessíveis e comunicação em rede, uma ética baseada no faça você mesmo e um compromisso em relatar livremente suas experiências contribuíram substancialmente para a documentação visual de inúmeras ações e protestos. Para que as imagens do fogo divulgadas pela grande imprensa não sejam apenas as únicas, esses documentários incorporam a máxima encontrada em uma das linhas de um comunicado anônimo escrito pelos anarquistas gregos em dezembro de 2008: “não assista aos noticiários da tv, a consciência cresce nas ruas” (2009: 65).
Que histórias podem ser contadas através da produção de outras imagens e narrativas sobre as lutas contra as medidas impositivas de um governo, durante o confronto com os aparelhos repressivos do Estado ou através do resgate de uma memória social? Que sentidos críticos podem ter as imagens captadas, editadas ou narradas por aqueles que também participam das manifestações que estão documentando, ou de acordo com o artista/ativista espanhol Marcelo Expósito, de que maneira esses registros possibilitam “pensar simultaneamente a representação da política e a política de suas representações”?[4] Ou retomando uma pergunta feita pela artista e documentarista Hito Steyerl: “que movimento de montagem política tem como resultado uma articulação de oposições ao invés de uma mera adição de elementos dispostos a reproduzir o status quo?” (2007: 339)
Através de diferentes estratégias, December Seeds, No Reconciliados (2009), dirigido por Marcelo Expósito, e Impasse (2010), realizado pelos jornalistas Juliana Kroeger e Fernando Evangelista[5], respondem a algumas dessas questões de múltiplas maneiras tratando de experiências situadas e objetivos específicos. As ações mostradas nesses filmes, que vão desde a ocupação das ruas como espaço de confronto e luta até o compartilhamento de ferramentas criativas pelos movimentos sociais, trazem diferentes modos de “inventar e concatenar corpos e signos”, gerando “formas de reapropriação da cidade e de seu espaço discursivo” (RAUNIG, 2008: 85). Suas narrativas revelam as possibilidades de modular dois tipos de história em tensão, conforme Michel de Certeau, sendo o primeiro tipo aquele que interroga sobre o que é pensável através dos documentos reunidos (depoimentos, imagens de arquivo, fotografias, textos, etc), enquanto o segundo tipo pretende encontrar o vivido, reconstruindo os traços deixados no passado e produzindo relatos (2000: 46).
Em alguns casos, estes três filmes criam zonas indistintas entre o vídeoativismo, o documentário militante, o cinema experimental, a inclusão de passagens poéticas ou de excertos não editados, além de reunir a colaboração de uma pluralidade de registros, como fez o documentário This Is What Democracy Looks Like (Esta é a Cara da Democracia, 2000), com imagens captadas por cerca de 100 videoativistas durante os protestos em Seattle contra a reunião da Organização Mundial do Comércio, em novembro de 1999.[6] Em Impasse, as histórias envolvendo as manifestações do Movimento Passe Livre, movimento autônomo criado em 2005 durante o Fórum Social Mundial em Porto Alegre, são contadas durante os meses de maio e junho de 2010, quando milhares de pessoas saíram às ruas de Florianópolis para protestar contra o aumento das tarifas de ônibus da cidade. Além de documentar as opiniões de empresários, políticos, sindicalistas, usuários e trabalhadores sobre as tarifas e a qualidade do transporte público, Impasse tenta compreender as manifestações de 2010 dentro do contexto das chamadas “revoltas da catraca”, quando os levantes populares realizados em Florianópolis, entre 2004 e 2005, conseguiram diminuir o preço das passagens de ônibus após uma violenta jornada de lutas pela cidade.
O documentário concentra-se em dar voz e denunciar os abusos das forças policiais durante os protestos. Estudantes são presos arbitrariamente nas ruas e dentro das universidades, são ameaçados com cassetetes e armas taser, têm seus protestos bloqueados e ainda resistem aos ataques policiais com placas trazendo mensagens com suas bandeiras de luta. Seus corpos também aparecem machucados pelas balas de borracha. Para o Secretário de Segurança Pública entrevistado no documentário, as imagens flagradas por Impasse das prisões realizadas no protesto ocorrido em 31 de maio de 2010 no campus da Universidade do Estado de Santa Catarina, mostram apenas uma tentativa rotineira da Polícia Militar em reprimir uma prática de “crime”. Os manifestantes também são mostrados em momentos de criatividade e reinvenção, ora como uma multidão cantando em uníssono uma das músicas do movimento, ou encenando um teatro de rua sobre o ataque das forças policiais.
Estes manifestantes, cidadãos e ativistas empregam modos legítimos de ação direta tanto em sua forma proativa, o que significa fazer as coisas do modo que acreditam que devem ser feitas, de maneira auto-organizada e sem representantes, como em sua forma reativa, que é o poder de resistir, de ocupar, de usar meios disponíveis para mudar algo, ou de produzir os seus registros para denunciar abusos e injustiças (MILSTEIN, 2010: 70). As edições desses vídeos e documentários são menos um instrumento de representação e mais uma oportunidade de produzir uma “forma que pensa”, para referir-se aqui a uma expressão de Jean-Luc Godard, explorando as questões do poder e da construção dos movimentos.
Para o documentarista Oliver Ressler (2003), estas práticas audiovisuais confrontam a visão distorcida da mídia corporativa e de sua cobertura jornalística, que insiste em afirmar a “neutralidade” diante dos fatos em detrimento das reais perspectivas de movimentos prejudicados por polarizações e aspectos negativos, ocultando ou distorcendo as reivindicações reais de uma manifestação sob o signo da violência. Imagens de ação e resistência alternadas pelas análises ou depoimentos de seus protagonistas colaboram com a construção direta de uma história coletiva que mede e analisa os acontecimentos, democratizando o acesso, a produção e a distribuição de testemunhos que não dependem da apuração dos grandes conglomerados da mídia, nem de influências comerciais e governamentais (MESQUITA, 2011: 154).
A “peça didática em cinco atos”, como define Marcelo Expósito o seu documentário No Reconciliados (2009), foge a quaisquer fórmulas aplicadas pelo cinema militante ou o videoativismo. Expósito constrói “um artefato analítico com seus artifícios retóricos, e narrativos com suas hipóteses” (LONGONI, 2009) para abordar as ferramentas das vanguardas estéticas colocadas em prática e a serviço da construção dos movimentos sociais na Argentina. Se em December Seeds o seu diretor incorpora as características dos documentários de Chris Marker no uso de citações de textos, imagens captadas nas ruas e reproduções dos noticiários televisivos com as vozes alteradas dos narradores simbolizando o discurso “oficial” desses eventos, No Reconciliados consegue ir além desses recursos pela escolha de uma leitura não-linear e descontínua, orquestrando uma montagem fragmentada que reúne documentos heterogêneos como imagens de arquivo, citações e testemunhos, compondo a estrutura de uma “história diagramática”. Expósito (2008) observa que os diagramas permitem visualizar “a trama de relações de negociação, colaboração, antagonismo, conflito, consenso e dissenso que se dão em uma situação determinada.” Diagramas ajudam a “produzir imagens das ressonâncias que têm lugar em um campo de forças. Um diagrama não pressupõe a existência prévia de um território a representar, mas é configurado mais como uma visualização esquemática que incorpora e explicita um ponto de vista sobre situações dinâmicas.”[7]
Relações coextensivas
As observações de Expósito sobre o conceito de história diagramática e as análises do professor Tom Conley sobre as relações “estranhamente coextensivas” entre cinema e mapas são úteis para observar as narrativas historiográficas e espaciais que estes documentários realizam acerca da ideia de um “cinema cartográfico”. Para Conley,
mapas aparecem na maioria dos filmes que assistimos. Mesmo que um filme não exibia um mapa como tal, por natureza, este tem uma relação implícita com a cartografia. Um mapa que vemos em um filme pode referir-se a uma localidade se o filme for um documentário, ou se conta uma história, referir-se a um itinerário. Ele pode pertencer a lugares os quais um espectador experimenta em um filme. Como um intertítulo ou um signo que diz onde o filme está acontecendo ou para onde os personagens estão indo, um mapa em um filme fornece informações, aguça a imaginação. Ele impulsiona a narrativa, mas também divide a nossa atenção, estimula o devaneio e faz os nossos olhos observarem tanto para dentro, para as nossas próprias geografias, como para fora, perambulando por um quadro sobre o qual nos envolvemos, por mais que desejamos, no espaço do filme. […] Um filme incentiva o seu público a pensar o mundo em conjunto com a sua própria articulação do espaço. […] Um filme estabelece uma geografia a qual cada espectador é convocado a lutar (2007: 1 e 2).
Se a história da cartografia é marcada pelo uso de mapas para a administração e controle do Estado ou de um império sobre um território, os mapas e diagramas configurados ou mostrados por esses documentários podem ser vistos como uma maneira de subverter esses poderes hegemônicos, ou ainda tornar visíveis os seus elementos ocultos, construindo “significados como uma base para a ação” (Wood e Fels, 2008: 194). Suas imagens geram uma forma de contracartografia ou uma geografia alternativa das cidades, incluindo não apenas os seus aspectos físicos, mas também as realidades sociais produzidas.
O primeiro movimento dramático do centro de uma cidade em chamas em December Seeds mostra cenas dos espaços de exclusão capitalistas onde se encontram os edifícios de negócios e as vitrines de lojas com seus manequins, alternadas pelas imagens dos manifestantes ocupando Atenas e atirando pedras e coquetéis molotov nos policiais. Unidos pela raiva e sobrevivendo a uma situação sem controle, onde a sua luta é muito maior do que apenas uma única demanda ou uma tentativa de transformar o poder (VRADIS, 2012: 66), as batalhas dos manifestantes gregos durante as tumultuadas revoltas de 2008 recordam em seu devir histórico uma das contundentes passagens de Walter Benjamin registradas no texto “Uma crônica de Berlim” (1932):
Durante muito tempo – durante anos de fato – trabalhei com a ideia de dispor graficamente a esfera da vida em um mapa. Inicialmente pensei em um mapa ordinário, mas agora me inclinaria por um mapa geral dos trabalhadores do centro de uma cidade, se é que tal coisa existe. Sem dúvida não existe porque ignoramos como será o cenário das guerras futuras (1979: 295).
Um mapa dos trabalhadores do centro de uma cidade foi desenhado no primeiro ato do documentário No Reconciliados, intitulado “Klucis em Bauen: Composição como prelúdio”. Uma imagem panorâmica do alto do Hotel Bauen discorre sobe a sua condição de “empresa recuperada em 2002 e autogestionada por seus trabalhadores após o colapso do neoliberalismo na Argentina.” O ritmo intenso das cenas dos carros e pedestres nas ruas é entrecortado pela frase “a arte de vanguarda é também uma empresa que deve ser recuperada pelos seus trabalhadores”. Montagens em movimento dos quadros de Tomás Maldonado[8] surgem sobre as paisagens urbanas de Buenos Aires. As adaptações poéticas das pinturas de Maldonado os transformam em novos mapas de uma cidade regressando ao político. A referência de Expósito à Cidade Dinâmica de Gustav Klucis, considerada a primeira fotomontagem realizada sobre um desenho construtivista em 1919, reativa pontes entre o legado das vanguardas históricas e as práticas artísticas e ativistas recentes (LONGONI, 2009).
As relações literais entre No Reconciliados e cartografias surgem em dois momentos significativos, por meio de “mapas como protesto ou comentário político” (CRAMPTON, 2009: 3). Um mapa da Praça de Maio introduz o espectador ao terceiro ato do documentário, chamado de “A política do acontecimento”, orientando-o a enfrentar uma quantidade detalhada de potentes fotografias e testemunhos da historiadora Ana Longoni e do fotógrafo Guillermo Kexel recuperando as memórias de uma experiência coletiva ocorrida há três décadas atrás, sobre a produção massiva de silhuetas pelos manifestantes durante a Terceira Marcha da Resistência, convocada pelas Mães da Praça de Maio em 21 de setembro de 1983. O Siluetazo foi um projeto dos artistas visuais Rodolfo Aguerreberry, Julio Flores e Kexel em criar silhuetas dos corpos das pessoas impressas em papel e em tamanho natural, coladas depois em muros, árvores e monumentos para reclamar a “aparição com vida” dos 30 mil desaparecidos durante o período mais repressivo da ditadura militar na Argentina, entre 1976 e 1983.
Um outro caso particular vem de encontro às experiências dos coletivos de ativismo artístico Grupo de Arte Callejero, Etcétera e Arte en La Kalle nos escraches, uma prática de ação direta idealizado pelo H.I.J.O.S.[9] durante os anos de 1990 para estimular a condenação social e o constrangimento público dos torturadores do regime militar argentino, interpelando sobre a ausência de condenação legal. A própria palavra escrache remete à ação de “lançar luz sobre o que está oculto”, de “revelar o que o poder esconde”. O Grupo de Arte Callejero (GAC) contribuiu com uma série de dispositivos simbólicos e visuais para os escraches, mas uma de suas ferramentas gráficas refere-se ao desenho de um mapa anônimo que foi colado nas ruas como um cartaz durante os 25 anos do golpe militar na Argentina, em março de 2001, mostrando os nomes e os endereços de centenas de genocidas. Um dos depoimentos dos integrantes do GAC em No Reconciliados diz que “quando [o mapa] apareceu na rua, as pessoas se amontoaram ao redor do cartaz para olhar, para buscar quem morava perto de suas casas. Foi incrível.” Mapas, protestos, ocupações, confrontos, espectros, silhuetas, presenças e ausências. Se pudermos imaginar um diagrama desses elementos relacionando-os e mostrando as forças de suas mudanças, chegaremos a desenhar mapas de muitos movimentos, com seus ritmos imprevisíveis afetando as memórias e os corpos. Intervenções diretas na vida, práticas criativas respondendo a sistemas econômicos predatórios e à violência, documentários que flertam com a política e os sonhos. Este é o momento de escrever sobre outras histórias que estão sendo contadas nas ruas, em uma luta onde caibam outras lutas.
NOTAS
[1] A nota em inglês encontra-se disponível em: <http://www.athensnews.gr/portal/1/54580>.
[2] Assim como nas ruas de países como a Espanha, prejudicada por uma situação econômica similar e enfrentando uma angustiante repressão das autoridades policiais sobre os protestos populares, como se pode ver nos vídeos das violentas agressões cometidas contra as pessoas no dia 11 de julho de 2012 na Puerta del Sol em Madri: <http://madrid.tomalaplaza.net/2012/07/12/lo-que-paso-el-11-de-julio-entre-las-22-y-las-23h-en-los-alrededores-de-la-puerta-del-sol>.
[3] Documentário disponível em: <http://www.black-tracker.gr/details.php?id=311>.
[4] De acordo com a apresentação escrita por Marcelo Expósito sobre a sua série de vídeos realizados desde 2002 e intitulada Entre Sueños. Filmado na Argentina entre 2005 e 2008, No Reconciliados é o quarto título da série. Mais informações em: <http://marceloexposito.net/entresuenos/introduccion>. Sobre No Reconciliados, ver a página <http://marceloexposito.net/entresuenos/noreconciliados>.
[5] Informações sobre o documentário em: <http://www.impasse.com.br/documentario/impasse>. Vídeo disponível em: <http://www.filmesquevoam.com.br/filme.php?id=15>.
[6] Sobre este documentário, ver a página <http://www.bignoisefilms.org/films/features/100-whatdemocracylookslike>. Uma versão legendada encontra-se em: <http://www.youtube.com/watch?v=jsTu4UDYPmE>.
[7] Expósito baseia-se nas observações de dois historiadores do cinema, Jenaro Talens e Santos Zunzunegui, que mostram que uma história diagramática permite “trabalhar uma história assumidamente fragmentada, descontínua, heterogênea e heterofundada em um mapa policêntrico, onde as hierarquias tradicionais entre centro e periferia, modelos dominantes e práticas subalternas se recombinam e se reinterpretam.” Ver Talens, Jenaro e Zunzunegui, Santos (eds.). Historia General del Cine, Volume 1: Orígenes del Cine. Madri: Cátedra, 1998.
[8] Artista que liderou o Movimento de Arte Concreto-Invención durante os anos de 1940 na Argentina.
[9] Grupo de direitos humanos formado por filhos de desaparecidos e exilados durante o período de “Guerra Suja” do Terrorismo de Estado do regime militar argentino.
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